quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Não conseguia respirar, tinha que sair.

Uma pessoa sozinha num pub/bar é olhada com estranheza.
Um grupo levanta-se para se ir embora, um dos individuos ao passar por mim olha para trás para me ver a cara.
Um bêbado insiste em olhar para mim. O corpo dele treme. Eventualmente levanta-se e começa por se introduzir, não ouvi o nome dele e respondo - “No, Sorry, I don´t want to talk”. Ele fica decepcionado e não me chateia mais, apesar de vez em quando ainda olhar na minha direcção.

Não me sinto invisível e sinto-me ok. A música eleva-me. Aquele som da guitarra eléctrica. Que instrumento versátil, forte e sedutor. Tão cheio de personalidade e ainda assim consegue incorporar diferentes personagens. O som da guitarra pode ser incrivelmente sexy e esta noite a guitarra provou isso.

Estou bem. Só me apetece chorar e rir às gargalhadas mas em vez disso bebo mais um pouco dessa bebida escura que hoje sabe a sal.
Quero mais, sinto-me oca por dentro. Quero estar sozinha, estou sozinha e quero abraçar.

Olho lá para fora e parece que estou em Nova York, mesmo nunca tendo lá estado parece que estou em Nova York.

Nesta cidade pequena cheia de tanto. Por onde andas tu?

Fui falar com o baixista e ele conhece-te.

Meia hora depois tu apareces-te e não me abraçaste.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Estarei eu no lugar certo? Haverá tal realidade para alguém; estar no lugar certo?

Estou doente, mais uma vez estou doente. Já perdi a conta de quantas vezes já fiquei doente desde que me mudei para esta cidade. Certo é que bem me recordo das duas últimas vezes que fiquei doente; acabei na sala de emergências.
Fui a pé até ao James Hospital, que fica a 10 minutos a paço rápido. Não faria sentido ir de táxi e pagar um balúrdio. A smokes foi comigo e fez-me companhia por algum tempo até que teve de se ir embora de volta para a Universidade.
Bem...mostrei o cartão Europeu de Saúde, preenchi uma ficha e fui vista por uma enfermeira que de seguida mandou-me esperar a minha vez na sala comum. Durante as mais de 9 horas que lá estive contei quantas pessoas alcoolizadas deram entrada no estabelecimento: Oito no total.
Talvez o serviço de saúde da República da Irlanda (que diga-se de passagem é um dos piores da Europa) devia tomar em consideração criar uma ala de “emergência “ somente para essas pessoas alcoolizadas.
Das duas vezes que estive (Março e Julho) na sala de espera das urgências tive que aturar bêbados a queixarem-se, a mandarem vir com a vida, com o sistema hospitalar (“I’ve been here forever”), a tropeçarem, a caírem…no geral a incomodar os pacientes e o staff to hospital com o cheiro e a presença insignificante do estado miserável deles.
Das duas vezes senti o mesmo, pena e desprezo por eles, bêbados. Estão ali a ocupar cadeiras, a passarem afrente de pessoas que estão doentes por circunstâncias acidentais, como estar com uma forte gripe, ter batido com a cabeça no armário devido a sua doença prolongada de Alzheimer, uma reacção alérgica fortíssima (rapariga rodeada por amigas espanholas histéricas que tentam confortar a rapariga que tem o top todo subido e coça sistematicamente as costas cobertas de enormes borbulhas encarnadas), ou uma criança de partiu o pé ao brincar durante o intervalo da hora do almoço na escola nessa tarde.

E estes bêbados estão aqui sem vergonha a pedir cuidados. 

Em Julho visitei a sala de emergências novamente. Sabia todo o processo; mostrar o cartão Europeu, preencher a ficha (onde o meu nome completo de seis nomes não cabe na linha estipulada), ser logo vista por uma enfermeira (desta vez um enfermeiro e uma enfermeira) para avaliar o meu estado. Com dificuldade expliquei os meus sintomas ao longo dos dias e disse que era-me muito doloroso engolir e falar. O senhor observou-me a garganta e fez uma cara surpreendida e séria. Chamou a outra enfermeira para observar-me a garganta tendo a mesma reacção que ele. Tiraram-me a febre, tensão e desta vez imprimiram-me uma pulseira hospitalar com o meu nome e com o nome do hospital.
Fui então sentar-me nas cadeiras de trás para ninguém olhar para mim e para eu ter controlo visual completo daquele espaço cheio de gente doente.

Sentia-me mais fraca sempre que olhava para ela. Aquela pulseira despertava-me pensamentos como: - Sim estou num hospital, sinto-me horrivelmente horrível em todos os aspectos. – Há pessoas nojentas á minha volta. – Sinto inúmeras bactérias e infecções no ar, nas cadeiras, no chão… - O meu pulso está fino e branco, sinto-me tão fraca. – Estou com nojo de mim e com nojo de todos, não quero que ninguém olhe para mim, não consigo e não quero falar com ninguém. – Tudo me irrita, tudo me incomoda. – Odeio, odeio mesmo hospitais, não há nada de positivo neles.
A certo ponto vi o mesmo rapaz a sair da ala de emergência que eu havia ter visto em Março. Digo rapaz porque parece-me que tenha entre 20 a 23 anos de idade. Ao vê-lo pela primeira vez fiquei muito surpreendida e envergonhada por eu ter estado o dia todo a queixar-me por estar assim tão doente. Grande parte da cara dele estava em carne viva coberta com um plástico transparente.
Passados estes messes nada parecia ter mudado. A cara dele continuava brutalmente queimada, e ele entrava e saía lá para fora, presumo eu para fumar um cigarro, sempre com uma postura firme, séria e com um andar confiante e destemido, como se nada de anormal passasse-se com ele. Eu com medo e curiosidade olhava sempre para ele, escondida lá trás criando histórias dramáticas para explicar o sucedido. Não sei como ele era antes, mas agora e sempre ele vai ser um homem marcado. Ele nunca vai esquecer o que lhe aconteceu. Os espelhos, as vitrinas nas ruas, os olhares das pessoas, as crianças a apontar, as dores que sentir, a sensação do vento e dos raios solares, o toque dos seus dedos a passar o gel de tratamento… tudo isso e mais vai assegurar a vida da memória e tudo isso e mais vai formá-lo como alguém muito diferente. 

Entretanto por volta da onze e meia o Darren veio ter comigo. Eu estava no hospital desde as cinco e meia da tarde e disse-lhe que não valia a pena vir ter comigo pois seriam muitas horas de espera, sem nada para fazer. Mas ele insistiu dizendo que já tinham passado várias horas e eu estava sozinha.
Fiquei nervosa sabendo que ele chegaria a qualquer momento e fiquei envergonhada quando ele apareceu. Isto porque eu estava branca e amarela, fraca, ranhosa, com os olhos feios, com dores de cabeça, com dores musculares, sonolenta, cansada, sem paciência, e com as amígdalas lentamente a asfixiar-me…e ele nunca me tinha visto assim. 
Vá lá que quando me viu foi querido e sorriu.

Não querendo acreditar eventualmente chamaram Isabel Cousta di Macíduo (Costa de Macedo). Lá dentro fui muito bem tratada, melhor ainda que da última vez. Claro que houve a mesma conversa sobre Portugal “Oh the Sun” “Oh, so lovely” blá blá blá… 

Fui tratada por um médico muito agradável que depois de analisar o meu estado levantou-se e voltou com outra médica para ter uma segunda opinião. Adorei a sensação de ter dois médicos jovens simpáticos e profissionais a discutir a melhor opção de tratamento para mim. Ao chegarem a um consenso o médico explicou-me o que iria fazer para me por melhor. Eu pedi para ser deitada numa cama porque sentia-me muita fraca e a ideia de perfurar a minha veia no braço esquerdo e ficar lá com uma agulha enfraquecia-me ainda mais e tinha medo de desmaiar. Já conhecia a sensação, seria a segunda vez que ia ficar a soro e é tudo horrível, do momento que se enfia aquela agulha comprida, sentir aquela água suspeita a cair lá de cima a percorrer um tubo de borracha transparente e entrar directamente na minha veia que entretanto fica inchada até ao momento de tirar a agulha e ficar com o braço com nódoa negra e todo dorido. Blahr. 
Antes de me porem a soro, (dois sacos grandes) o médico injectou-me lentamente um saco de antibiótico. Assim que o líquido entrou na veia comecei a sentir um ardor muito forte no braço que percorreu o meu corpo todo. Fiquei confusa, desconfortável e nervosa a olhar para o médico e para o Darren. “Dr. are you sure this is ok? I’m feeling some really weird things!.” A resposta foi óbvia: que sim era normal…
O Dr. foi salvar mais pessoas e eu e o Darren ficamos ali a tirar fotografias e a rir do meu estado. Ele cheio de paciência e boa disposição mesmo sabendo que teria de ir trabalhar dentro de umas horas. Falei com a minha momy ao telemóvel a resumir a saga que foi e de como aquele antibiótico miraculoso em minutos amaciou as minhas amígdalas permitindo-me engolir e falar sem doer. E… claro fiz-me de mariquinhas para receber uns miminhos – “coitadinha da minha bibinhas, longe sem os meus cuidados”. 

O Darren levou-me de táxi e quando cheguei a casa era 5:30 da manhã.

Aqui estou eu doente a escrever. Estou doente mais uma vez. Já perdi a conta de quantas vezes já fiquei doente desde que me mudei para esta cidade.
Parece-me que não vá ter de ir às emergências desta vez. Sinto-me melhor, bem melhor. Ainda assim não me deixo de questionar se estarei eu no lugar certo? Existe a realidade correcta de estar no sítio certo? Como se descobre isso? 

Agora dói-me a cabeça por causa das relações humanas – Fucking pain in the ass. Não percebo nada, é tudo demasiado complicado demasiado contraditório.
Mas agora de nada interessa. É outra história…bem comprida e bem difícil de se escrever.

A completely different story…maybe to be unveiled another time. Not tonight though, not tonight.